domingo, 11 de dezembro de 2011

Vereadores do Rio fazem festa com dinheiro do povo...


Palácio Pedro Ernesto Reprodução da internet



RIO - O gabinete bem decorado, com direito a TV de LCD, no anexo do Palácio Pedro Ernesto, é uma verdadeira usina de homenagens. No ano passado, o vereador Dr. Gilberto (PTdoB) concedeu nada menos do que 1.879 diplomas de reconhecimento, as moções de aplausos. Apenas uma parte das 13.325 dadas pela Câmara do Rio nesse período, o equivalente a dez por hora, ou 69% do total de 19.204 ações parlamentares registradas. Se são especialistas em parabenizar os cidadãos, os legisladores cariocas pisaram no freio na hora de aprovar leis: foram 94 em 2010. Algumas de relevância discutível. Excluídas concessões de títulos de utilidade pública, de cidade-irmã; mudanças no calendário oficial ou nomes de ruas ou praças, sobraram 13 projetos (0,06%), sancionados ou promulgados, propostos por eles mesmos: um a cada 12 dias úteis. Ao todo, só o Executivo emplacou 18.


A produção pesa no bolso dos contribuintes. Até o ano passado, como admite o próprio presidente da Casa, Jorge Felippe (PMDB), a Câmara do Rio, com 51 vereadores, era a mais cara do país: foram pagos R$ 308.300.000,00 para manter as atividades dos parlamentares cariocas. Levando-se em conta os 161 dias úteis de 2010, a instituição custou R$ 1.900.000,00 por dia. Felippe garante que, assim que o exercício de 2011 for encerrado, o Rio perderá o título de campeão de gastos para São Paulo.

Para chegar aos números da máquina de congratulações, repórteres do GLOBO fizeram um levantamento durante dois meses com os dados disponíveis no site da Câmara (www.camara.rj.gov.br) do ano de 2010, o último fechado. O líder de homenagens, o médico Dr. Gilberto — morador de Campo Grande e que assumiu o cargo após a cassação de Carminha Jerominho — procurou caprichar nos textos dos diplomas de reconhecimento, a maioria voltado a enfermeiras: "(...) é uma arte; e para realizá-la como arte, requer devoção tão exclusiva, preparo tão rigoroso, quanto à obra de qualquer pintor ou escultor; pois o que é tratar da tela morta ou do frio mármore, comparado ao corpo vivo, o templo do espírito de Deus?"
Apesar das 1.879 moções, Dr. Gilberto afirma ter "conhecimento profundo" da maioria das pessoas a quem concedeu a honraria. Entre elas, estiveram inclusive 13 fundadores de seu partido.

— O número de homenagens à legenda foi até pequeno. São pessoas que trabalham com bastante qualidade, idôneas, que fazem um trabalho bacana para a cidade do Rio — ratifica ele.

Entre os contemplados pela Câmara, estão também cabos eleitorais. Dr. Jorge Manaia (PDT), autor de 382 moções, usou de belas palavras para agradecer o apoio dispensado no pleito do ano passado: "Eleger nossos representantes no Legislativo foi uma grande Vitória... Desta forma homenageio a todos os que atuaram como verdadeiros Soldados de Cristo na eleição de 2010".

Em nota enviada por e-mail, Manaia diz não ver problemas nesse tipo de congratulação: "Moção é uma espécie de proposição prevista no regimento interno desta Casa, pela qual os vereadores democraticamente manifestam, dentre outras possibilidades, todo seu regozijo. E assim o fiz, rigorosamente dentro dos preceitos legais que me compete (sic)".

Outro que se destacou pela farta distribuição de diplomas, com 1.426, foi o vereador Tio Carlos (DEM). Ele defende o derrame de confetes, voltado a profissionais que exercem principalmente trabalhos sociais ligados à criança e ao adolescente. Admite apenas um certo exagero:

— Talvez tenha me excedido no primeiro ano no caso das mães. Procuro homenageá-las porque minha mãe foi para o céu muito cedo, quando eu tinha 13 anos. É algo que faço com muita emoção — diz ele, ressaltando que nunca faltou a uma sessão da Casa e trabalha em 18 comissões.

Fiscalização prejudicada pela falta de informações
Apesar de os vereadores afirmarem que as moções têm custo ínfimo, são confeccionados diplomas, há publicação em Diário Oficial da honraria e, constantemente, o plenário é usado em solenidades para a entrega dos documentos.

No ranking da produção da Casa, depois das 13.325 moções, os vereadores se dedicaram arduamente em 2010 a elaborar 3.378 indicações legislativas — pedidos de benfeitorias, como podas e asfaltamentos — que dependem da boa vontade do prefeito para serem executadas. Em seguida, vieram os 988 requerimentos internos da Casa (pedido de utilização de espaços, por exemplo). Na quarta colocação estão os 818 requerimentos de informações ao Executivo. Teoricamente, esse seria o principal instrumento para que o vereador exerça seu papel fiscalizatório, cobrando dados e explicações da prefeitura. O prazo para respostas é de 30 dias, prorrogáveis por mais 30.

— Para se ter um ideia, temos 18 respostas pendentes, com atraso atualmente. No ano passado, tivemos até que recorrer ao Ministério Público para conseguir que a prefeitura retornasse os nossos pedidos. Muitas vezes, a resposta chega, mas incompleta e sem atender ao que perguntamos — comenta a vereadora Andrea Gouvêa Vieira (PSDB), a que mais utilizou o instrumento em 2010, com 162 requerimentos.

Para o doutor em ciências políticas e diretor do Iuperj, Geraldo Tadeu, a produção da Câmara carioca reflete o que ele classifica de apequenamento do legislativo brasileiro, principalmente o municipal.

— A produção das câmaras municipais costuma ser pequena e de má qualidade. Quase irrelevante. Ficam reduzidas a grandes centros de convenções, concentradas na concessão de moções, títulos, resoluções declarativas etc... Com isso, o Executivo desempenha um papel de legislador mais efetivo do que os próprios legisladores.

Crédito:
O GLOBO

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