quinta-feira, 25 de agosto de 2011

CASSINO GLOBAL

Escritor, autor de ‘O amor fecunda o Universo – ecologia e espiritualidade’, em parceria com Marcelo BarrosRio - A foto do jornal me causou horror. A criança somali lembrava um ET desnutrido. O corpo, ossinhos estufados sob a pele escura. A cabeça, enorme, desproporcional ao tronco minguado, se assemelhava ao globo terrestre. A boca escancarada de fome emitia um grito mudo, amargura de quem não mereceu a vida como dom. Mereceu-a como dor. Ao lado da foto, manchetes sobre a crise financeira do cassino global. Em dez dias, as bolsas de valores perderam US$ 4 trilhões.

Estarrecedor!Tive vergonha da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que reza que todos nascemos iguais, sem propor que vivamos com menos desigualdades. Vergonha de não haver uma Declaração Universal dos Deveres Humanos. Vergonha de tantas mentiras de nossas democracias governadas pela ditadura do dinheiro.

US$ 4 trilhões derretidos na roleta da especulação! O PIB atual do Brasil ultrapassa US$ 2,1 trilhões. O PIB mundial é, hoje, de US$ 62 trilhões. E no cassino global se negociam papéis que somam US$ 600 trilhões!À criança somali faltou o mais básico de todos os direitos: o pão nosso de cada dia. Aos donos do dinheiro, que viram suas ações despencarem, nenhum prejuízo. Nenhum deles se vê obrigado a abrir mão de seus luxos.

Sabemos que a conta da recessão, de novo, será paga pelos pobres. São eles os condenados a sofrer com a falta de postos de trabalho, de crédito, de serviços públicos de qualidade. Eles enfrentarão o desemprego, os cortes nos investimentos do governo, as medidas propostas pelo FMI, o recuo das ajudas humanitárias.Mas deixemos o pessimismo para dias melhores! É hora de reacender e organizar a esperança, sobretudo transformar a indignação em ação efetiva por um mundo ecologicamente sustentável, democrático e justo.

Frei Betto: Cassino global

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